Os juristas ouvidos pelo JN destacaram o Artigo 85 da Constituição: são crimes de responsabilidade os atos do presidente que atentem contra a Constituição e, especialmente, contra: o livre exercício do Poder Legislativo, do Judiciário, do Ministério Público e dos poderes constitucionais das unidades da federação; e ainda contra o cumprimento das leis e das decisões judiciais.
O ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Ayres Britto recorreu a uma expressão usada pelo próprio presidente Bolsonaro.
“Não perco a oportunidade para dizer que é do meu agrado ouvir o presidente dizer que joga nas quatro linhas da Constituição. Acontece que nas quatro linhas da Constituição há dois protagonistas estatais por definição. São os que primeiro entram no campo para jogar. Por essa ordem, o Legislativo e o Executivo. E o terceiro que entra em campo é como árbitro, como juiz dessa partida. E o juiz é o Poder Judiciário. Ora, quando essas decisões são tomadas, o que cabe ao Poder Executivo é respeitar. As regras do jogo são essas, elas estão na Constituição. Fugir, para usar de uma linguagem que o presidente vem usando, não é muito do meu agrado, mas eu vou usar dessa linguagem, ‘enquadrar’. Em nenhum dispositivo da Constituição o presidente da República enquadra mento do Poder Judiciário. Menos ainda o ministro do Supremo, menos ainda o Supremo como um todo. Os ministros do Supremo e o Supremo como um todo é que podem enquadrar membros do Poder Executivo. Isso está na Constituição, isso faz parte das regras do jogo”, afirmou Ayres Britto.
O professor de Direito Penal da Fundação Getúlio Vargas Thiago Bottino criticou os ataques do presidente ao sistema eleitoral.
“Eu fico muito surpreso de ouvir de uma pessoa que se elegeu durante oito vezes por esse sistema, que se elegeu presidente por esse sistema, agora diga que esse sistema não funciona. Esse sistema vem funcionando muito bem justamente por conta da Justiça Eleitoral, que é a guardiã desse sistema eleitoral. Descumprir a decisão das urnas, quaisquer que seja ela, também caracteriza um crime de responsabilidade. À medida que o povo se manifestar e escolher, tomar sua decisão, essa decisão tem que ser respeitada por todos. Você não pode, ao ensejo de questionar o processo, impor a sua vontade”, disse Bottino.
O também ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Celso de Mello defendeu a independência do Poder Judiciário diante das ameaças de Bolsonaro.
“Essa conduta de Bolsonaro revela a figura sombria de um governante que não se envergonha de desrespeitar e vilipendiar o sentido essencial das instituições da República. É preciso repelir, por isso mesmo, os ensaios autocráticos e os gestos e impulsos de subversão da institucionalidade praticados por aqueles que exercem o poder. Enquanto houver cidadãos dispostos a submeter-se e a curvar-se ao arbítrio e à prepotência do poder, sempre haverá vocação de ditadores. Daí a significativa e vital importância do Poder Judiciário, cujos magistrados saberão agir com independência e liberdade decisória, dispensando tutela efetiva aos direitos básicos da cidadania”, disse Celso de Mello.